COMÉDIAS DA VIDA ESCOLAR
Por: José Claudio Höfling Filho
Vocês já assistiram as “Comédias da Vida Privada”? Aquela famosa séria televisiva do autor Luis Fernando Veríssimo em que o cotidiano familiar e profissional chocam-se em bem humoradas histórias.
Pois bem, aproveito a oportunidade para abrir neste blog (guardada as devidas proporções) uma nova série de relatos e curiosidades do mundo da Educação Física denominada “Comédias da Vida Escolar” com o episódio intitulado: Resistência pedagógica e falso moralismo familiar.
É praticamente imensurável a quantidade de pais e familiares que se auto intitulam “conhecedores profundos da vida escolar de seus filhos” e mais: “conhecedores profundos de todo o processo pedagógico escolar de seus filhos”.
Tenho a (in)satisfação de vivenciar diariamente (e acredito que milhares de outros profissionais da Educação também) de eventos e ocorrências de pais e familiares dentro da Escola. De pais que adentram alcoolizados, raivosos, descontrolados ou inquietos com as condições ou situações em que seus filhos estão ou foram expostos, para pais participativos, cooperativos e preocupados com o bom andamento e a conjuntura escolar em que seus filhos estão inseridos.
Mas é no quesito “cobranças” que os pais se consagram campeões no cotidiano escolar. Cobrar menos tarefas para seus filhos (acreditem, isso é muito comum) ou solicitar uma atitude menos controladora e autoritária dos professores ou da Escola para que seus filhos possam produzir mais é alguns dos mais variados acontecimentos que presenciamos. Pais que jamais frequentaram uma reunião escolar (muitos só vem à Escola para fazer a matrícula) só adentram novamente para tratar de assuntos comportamentais de seus filhos (que geralmente ou diariamente resistem aos padrões mínimos de civilidade dentro da Escola).
Muitos deles insistem que seus filhos são perseguidos ou que tais atitudes negativas sempre terão uma segunda explicação/absolvição de seu filho.
Comédias à parte e sem prolongar muito essas questões (até porque cada caso é um caso) não quero neste relato desmerecer nem ao menos minimizar a importância da presença e atuação dos pais na vida escolar, pelo contrário, pois tenho a convicção de que a ação intensiva e racionalmente fiscalizadora dos pais combinados com o feedback e as informações transmitidas a eles (e vice versa) é um indispensável instrumento para o desenvolvimento e acompanhamento do aluno.
Infelizmente essa parceria é pouco/mal empregada no dia a dia escolar distanciando cada vez mais a relação escola – aluno – família.
Pretendo expressar com minhas palavras neste texto a irracionalidade (observada em minha vida profissional) frente à Educação dos filhos por parte de alguns pais por meio de suas reivindicações, cobranças e críticas à Escola assim como a falsa moralidade observada em algumas situações, vejamos:
Muitos professores se cercam de diversas formas de avaliar seus alunos ou simplesmente como alguns denominam, “verificar o desenvolvimento pleno de seu aluno”.
Entre as diferentes formas de avaliação podemos destacar as pesquisas dirigidas, trabalhos específicos e provas dissertativas, que são considerados satisfatórios instrumentos para avaliar tais desempenhos.
Porém, toda atividade ou iniciativa pedagógica que foge da esfera corporal ou da prática (corporal?) da Educação Física ainda é encarada pelos alunos de forma preconceituosa ou descontente. Afinal, o aluno pode pensar da seguinte forma: “porque vou estudar algo que sei (ou que penso que sei)”?
Se o professor orientar que seus alunos façam um resumo de regras de futsal, por exemplo, certamente o objetivo da atividade ou avaliação ficará comprometido e a reclamação e insatisfação dos alunos será pertinente.
Observei um caso interessante que autentica o que estamos tentando evidenciar.
O departamento de Educação Física de uma escola particular havia adotado no início do ano letivo uma nova postura frente à avaliação de seus alunos, onde atividades de cunho teórico e outros processos avaliatórios foram incorporados com a finalidade contemplar diferentes habilidades dos alunos.
Porém, tudo que é novo realmente passa por um processo de afirmação quanto a sua legitimidade e ao mesmo tempo de desconfiança tanto por parte dos alunos quanto dos professores (acreditem, alterar o ritmo de trabalho de um professor, ou seja, mexer em algo que esta sossegado, tranquilo e fácil é motivo de muito resistência).
Quanto maior a idade tanto dos alunos quanto dos professores, maior é a resistência para aceitar e acolher algo novo para atingir novas experiências e resultados. Se iniciarmos um projeto pedagógico o mais cedo e apropriado possível, menor será a oposição/ resistência e mais cedo as mudanças serão contempladas e observadas.
Voltando ao nosso episódio, por meio dos novos atos institucionais (de processos avaliatórios), é aceitável observar uma sinuosidade nos resultados dos alunos obtidos com estas novas avaliações. Alunos até então acostumados a receberem médias consideráveis (na maior parte dos casos devido às suas aptidões e habilidades corporais) deparam-se agora com novos desafios e consequentemente inquietações sobre seu desempenho. Isso não quer dizer que os alunos, só por forças dessas mudanças, não atingirão suas notas e desempenhos anteriores, afinal, o aluno está (ou deverá estar) acostumado a mudanças/ desafios e novas rotinas de trabalho.
E quando as coisas não vão bem, onde esses alunos se apoiarão em primeira estância: naturalmente nos pais.
Onde invariavelmente os pais não despejavam suas atenções no boletim escolar (no qual seu filho sempre aparecia com notas máximas, ou o famoso A ou A+) agora se vêem forçados a compreender novas tendências de desempenho de seu filho, virando motivo de preocupação.
Reinserindo a comédia novamente, nesta mesma escola e passado as primeiras notas bimestrais, observou-se um aumento expressivo de pais (aqueles mesmos detentores do saber acadêmico e da fiscalização escolar de seus filhos) revoltados e voltando-se contra os professores devido as suas novas metodologias de trabalho.
Veja aqui algumas das frases proferidas por esses pais:
- Porque meu filho fará mais provas se é Educação Física?
- Eu acho que meu filho já estuda demais e mais provas o atrapalharão.
- Desde quando tem que fazer prova para fazer Educação Física?
- Meu filho esta sendo prejudicado nas notas de Educação Física por causa das provas... ele nunca precisou fazer isso antes!
- Se continuar assim, vou pedir um atestado para meu filho não fazer mais Educação Física!
- Se isso continuar, vou tirar meu filho dessa escola!
Charge publicada originalmente no jornal francês Quest-France
Pára tudo! Agora mexemos num vespeiro! Alunos saindo da escola por esses motivos configura caso de intervenção por parte da diretoria.
Em um pensamento diretor (empobrecido e pedagógicamente frágil) certamente observaríamos esta linha de raciocínio: "não podemos perder mais alunos e ainda mais por causa de invenções pedagógicas por parte da Educação Física!"
E o que vemos é um triste e melancólico cabresto pedagógico, onde as idéias, as novas concepções, as novas tentativas e o ânimo de construir algo novo para a escola e alunos são tolhidas cruelmente por gestores ou diretores despreparados.
Afinal, não é interessante nem mesmo lucrativo fazer e incentivar o professor a pensar a agir, a construir e sim mantê-los sob controle (pois isso gera despesa e pouco retorno financeiro). E o pior de tudo isso é quando os próprios professores de Educação Física sabotam essas iniciativas jogando pais e alunos contra a coordenação ou outros professores, mas isso é uma discussão para uma outra oportunidade, quando falaremos sobre caráter.
Tenho a convicção de que os pais e professores querem o melhor para seus filhos e alunos.
Buscar, inovar e estreitar as relações aluno-família é uma competência comportamental que deve ser diariamente trabalhada pelos professores e fomentada, fortalecida e respaldada pelas equipes diretivas.
Por fim, é dever dos pais fiscalizar, observar e porque não questionar toda a vida escolar de seu filho, desde que esteja amparado na racionalidade, no bom senso, na responsabilidade e no ato de estar desarmado de intenções e pré-julgamentos das ações e inovações pedagógicas do professor.
Quer saber mais sobre Luis Fernando Veríssimo?
Ola Prof. Claudio, a realidade é essa mesma, infelizmente fazer algo diferente, muitas vezes não depende só de nós, e o novo geralmente tras insegurança e preocupação á equipe diretiva, mas orgulho de professores que gostam de ousar e desafiar o novo.
ResponderExcluirParabéns pelo blog, estarei sempre por aqui
Edna Lins
Obrigado Edna... realmente ousar e desafiar o novo requer um espírito livre... um comprometimento pessoal de mudar (para o melhor - sempre) e certamente a paciência para alcançar essas metas.
ResponderExcluirSeja bem vinda... Claudio
Oi Prof. Claudio!
ResponderExcluirComédia da Escola Privada... é um bom título pra tudo o que acontece nas escolas. Eu tenho um conhecido que diz assim: "A escola de hj, se cercarmos (no sentido de cerca mesmo) vira prisão e se cobrirmos vira circo." Mas nós somos professores, persistentes... e não devemos temer o novo. Adorei seu blog. Depois vc visita o meu:
http://caixadeletrasabc.blogspot.com.
Ariadne
Obrigado por estar aqui professora. Realmente nos dias de hoje a gente não sabe se ri ou se liberta da Escola.
ResponderExcluirAbraços... Claudio
Oi Prof. Claudio, adoramos o seu blog e seus esclarecimentos tão inteligentes. A escola estava precisando de iniciativas como essa. Parabéns! Que suas idéias sejam valorizadas e produzam frutos.Abraços, vó Creusa e tia Silvia 14/02/2010, 9.50hs
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